Novos processos, técnicas e ferramentas que apoiam o processo de desenvolvimento de software são introduzidos no mercado quase diariamente. Mas fica a dúvida sobre como funciona a curva de adoção da inovação!
Afinal, mesmo práticas consagradas como métodos ágeis e continuous delivery, em algum momento, passaram por um processo de adoção pelo mercado.
Embora essas técnicas e práticas tenham notórios benefícios, como aceleração do time-to-market, melhoria da qualidade do produto e satisfação de clientes, é natural que pessoas usuárias tenham algumas dificuldades (ou até resistência) em utilizá-las em um primeiro momento.
Essas dificuldades acontecem, pois, embora muitas pessoas possam se sentir animadas para testar uma nova tecnologia, o processo de adoção pode ser notoriamente desafiador.
Topa mergulhar nesse tema sobre os desafios do ciclo de produto? Bora!
Novidades são desafios
Durante quatro anos a empresa Paddy Power, focada em apostas e jogos, – com faturamento de €7 bilhões de euros por ano e com aproximadamente 5000 pessoas colaboradoras – se submeteu a um estudo observacional, que percebeu uma série de dificuldades em adotar continuous delivery na instituição.
Dentre os desafios, destacava-se: a incapacidade de fazer releases a qualquer momento, pois o processo de entrega era manual e engessado; e a falta de confiança nas entregas, pois era comum falhas e incidentes acontecerem durante o deploy.
Mesmo tecnologias disruptivas como blockchain também contam com uma série de desafios, que users precisam superar para poder aproveitar os benefícios mencionados.
Embora essas dificuldades sejam específicas a uma determinada tecnologia, ao lançar um novo produto é importante conhecer um pouco mais da história de produtos correlatos para tentar entender quais seriam os principais desafios da usabilidade do seu produto; e, assim, se preparar para tentar minimizá-los durante o processo de adoção.
Neste artigo, reportamos os resultados de uma revisão da literatura sobre os desafios que novas tecnologias enfrentam ao serem lançadas no mercado de software (e como elas podem ser minimizadas). Mas antes de falar dos desafios, é importante entender um pouco sobre o ciclo de vida de adoção de tecnologias.
Curva de adoção da inovação
A curva de adoção da inovação, também conhecida como ciclo de vida de adoção de tecnologia ou curva de adoção de tecnologia, é um modelo padrão que reflete a pessoa usuária e o seu comportamento.
O processo de adoção envolve várias etapas e diferentes users. De maneira geral, esse ciclo de adoção de novas tecnologias pode ser ilustrado pela curva de adoção tecnológica, que apresenta o processo de adoção tecnológica usando uma curva normal, em que cada parte da curva representa um destes grupos de pessoas usuárias:
- Entusiastas;
- Visionários;
- Pragmáticos;
- Conservadores;
- Céticos.
A figura abaixo apresenta como esses grupos são organizados. Vamos falar um pouco deles a seguir.
- Entusiastas: são as pessoas que gostam de tecnologia. O grupo é o “porteiro” que permite a entrada de qualquer nova tecnologia no mercado. A aprovação de Entusiastas é fundamental para o sustento de uma tecnologia no ciclo de vida.
- Visionários: são um grupo de otimistas que correrão o risco de experimentar novas tecnologias como forma de ganhar vantagens competitivas e, assim, estabelecer presença no mercado.
- Pragmáticos: utilizam tecnologias que já foram experimentadas e testadas em mais escala, e sabem quando podem tirar proveito destas para melhorar suas atividades e processos.
- Conservadores: tendem a não gostar de inovações e preferem manter seu processo de maneira tradicional. É pouco provável que esse grupo de usuários comprem produtos de alta tecnologia (e nem se espera que eles gostem).
- Céticos: são grupos de usuários mais tradicionais que rejeitam (quase que imediatamente) novas tecnologias.
Segundo ainda este modelo, Entusiastas representam apenas 2,5% de users que adotam uma tecnologia, enquanto que Visionários representam 13.5%, Pragmáticos e Conservadores representam 34% cada. Por sua vez, os restantes 16% representam o grupo dos Céticos – mas isso quando falamos do público geral.
É importante notar que estes percentuais representam uma regra geral e que dependendo do tipo de tecnologia e mercado em que estiver inserido, estes percentuais podem sofrer alterações.
Case na Zup
Em dezembro de 2021, quando realizamos o primeiro OrangeDay, evento interno da Zup para testar uma nova tecnologia, perguntamos para as pessoas participantes como estas se caracterizam no ciclo de vida da adoção de uma nova tecnologia.
De 27 pessoas que responderam esta pergunta:
- 40,7% se consideraram do grupo Visionários;
- 40,7% se consideraram Entusiastas;
- Enquanto que o restante (18,6%) se consideraram Pragmáticos.
Essa diferença aconteceu pois quem participou tinha interesse de fato em testar uma nova tecnologia. Logo, era menos provável que Conservadores ou Céticos participassem do evento.
Ciclo de vida de um produto
De maneira complementar ao ciclo de vida da adoção de uma tecnologia, existe também o ciclo de vida de um produto, que é geralmente representado por uma curva que lembra um formato de um “S” (como no gráfico mencionado acima), que pode ser dividido em três etapas.
Parte 1
A primeira parte do S (o início da subida) é o momento em que o produto está em constante inovação e está prestes a ser introduzido no mercado. Esse é um ponto sensível, pois o produto ainda está tentando ganhar tração de mercado e pouco se sabe sobre a capacidade de adoção.
Parte 2
A segunda parte do S (a subida mais íngreme) é destinada para produtos que conseguem passar pelo primeiro momento de adoção pelo mercado, e tendem a ganhar mais espaço e tração.
É nesse momento em que os custos de marketing também aumentam, de forma a captar um número ainda maior de clientes.
Parte 3
Por fim, a última parte da curva (parte menos acentuada) é destinada a produtos mais estabelecidos no mercado. Nesse momento, o desafio passa a ser manter a base de users fiéis ao produto, uma vez que a entrada de novas pessoas tende a ser menor.
Comportamento e ciclo do produto
O início de um produto ou feature nova é marcado por uma incerteza maior, pelo simples fato de estar fazendo algo que ainda não foi realizado antes (pelo menos naquele contexto e conjuntura de condições). Essa situação acarreta em uma instabilidade maior, trazendo também maiores riscos de falhas e de mudanças drásticas no produto.
Isso significa que uma parte significativa de users, que usam uma tecnologia logo no seu começo, são Entusiastas e Visionários. Quer dizer, são pessoas que toleram com mais facilidade pequenos bugs e poucas funcionalidades.
Essas pessoas adotam tecnologias pelo simples prazer de experimentar algo novo. No entanto, após seu produto ganhar tração de mercado, é esperado que os demais grupos tenham acesso à tecnologia e esses, sim, são mais criteriosos.
Entender o ciclo de vida de adoção de uma tecnologia (ou um produto) é saber planejar o que pode ser entregue para quem. Por exemplo, enquanto Visionários toleram pequenos bugs, Pragmáticos já precisam de mais suporte, talvez um software mais bem testado com documentações mais extensas.
Users com perfil que se encaixa com o grupo de Conservadores, por sua vez, talvez precisem de evidências sólidas para usar seu produto (cases de sucesso, por exemplo).
O episódio #54 do Zupcast sobre Produto x Projeto pode te ajudar a entender ainda mais sobre o assunto.
Quais são os desafios para adoção de uma nova tecnologia?
Após entender que diferentes grupos devem adotar sua tecnologia em momentos diferentes, o próximo passo é planejar e tratar os desafios que estes devem encontrar.
O processo de discovery é uma atividade conhecida para tentar antecipar os potenciais riscos (e minimizar desperdícios de tempo e esforço) na construção de um produto. O processo também busca minimizar pelo menos quatro tipos de riscos na criação de produtos. Inclusive, esse tema já foi debatido no blog da Zup.
Vários desses desafios são específicos, por exemplo, ao adotar práticas ágeis, a Motorola percebeu algumas dificuldades em fazer com que seus times ágeis colaborassem com equipes que seguiam um processo de desenvolvimento mais tradicional.
Porém também percebemos alguns desafios mais gerais, como:
- Vantagem relativa;
- Complexidade;
- Compatibilidade;
- Experimentabilidade.
Vamos conversar um pouco sobre cada um desses itens a seguir.
Vantagem relativa
Vantagem relativa está relacionada a dificuldade em encontrar vantagens competitivas em utilizar algum produto ou serviço. Users que encontram esse tipo de dificuldade se preocupam se seus dados podem ser perdidos ou da quantidade de tempo que precisam empregar para poder ter domínio da tecnologia. Enfim, quem tem pouco tempo ou incentivo para usar a tecnologia tem grandes chances de abandoná-las.
Complexidade
Complexidade é sobre como uma tecnologia é percebida como difícil de entender e utilizar. Essa dificuldade é, novamente, amplificada pela falta de tempo, recursos e habilidade das pessoas usuárias em apontar e solucionar os problemas encontrados.
Visionários tendem a ter mais tolerância, pois, de certa forma, estão cientes da existência de uma curva de aprendizado. Programas de mentoria e treinamento se fazem necessários para essas pessoas.
Compatibilidade
Compatibilidade está relacionado ao uso da tecnologia em conjunto com as demais já existentes no ambiente de trabalho. Embora dificuldades de integração de tecnologias sejam recorrentes na literatura, barreiras linguísticas também são dificuldades relacionadas à compatibilidade.
Dessa forma, pessoas usuárias menos habilidosas com a língua em que a tecnologia foi criada/documentada tem mais chances de abandoná-la. Compatibilidade também está relacionado ao grau em que a tecnologia é avaliada de forma consistente com os valores, experiências e crenças de users.
Experimentabilidade
Experimentabilidade tem a ver com a possibilidade de experimentar a tecnologia antes da sua adoção. Quando Visionários e Pragmáticos ganham a possibilidade de experimentar uma tecnologia em estágio beta tendem a minimizar preocupações e adotam a novidade.
Por outro lado, a falta de um momento reservado para experimentar a tecnologia pode levar as pessoas a esquecer o que foi aprendido, contribuindo para a descontinuação do uso da tecnologia.
Com quais dessas dificuldades devo me preocupar?
Como nem sempre temos o tempo e os recursos necessários para trabalhar em todos os quatro grupos de dificuldades mencionados acima (e mesmo se tivéssemos o capital, abordar todos esses itens poderia atrasar a penetração da tecnologia do mercado), faz sentido pensar em focar em um grupo específico? Talvez sim.
Na nossa revisão da literatura, observamos que barreiras de complexidade são comumente reportadas, em trabalhos de diferentes nichos. Dessa forma, focar na facilidade de uso talvez seja uma importante métrica para sua nova tecnologia.
No entanto, a facilidade de uso de uma tecnologia dificilmente pode ser capturada utilizando somente uma única métrica, um único valor. Para medir a facilidade de uma tecnologia, precisamos na realidade de um conjunto de métricas.
No trabalho de Seffah, foi discutido um modelo com um conjunto de métricas para avaliar a facilidade de uso. Algumas dessas métricas são:
- Eficiência;
- Eficácia;
- Produtividade;
- Satisfação;
- Aprendizagem.
Cada uma dessas métricas têm formas diferentes de serem avaliadas (recomendo a leitura do artigo de Seffah e seus colegas para entender um pouco mais) e, por sua vez, devem variar conforme as necessidades da tecnologia em questão.
Conclusão
Quando for lançar um novo produto, leve em consideração os ensinamentos deste artigo sobre a curva de adoção da inovação, passando pelos desafios da implementação de novas tecnologias e o comportamento das pessoas usuárias, representadas pelos grupos.
É fato que existirão desafios e que um conjunto de métricas analisadas com cuidado será a chave para entregar a melhor versão do seu produto no mercado.
A mensagem final que gostaria de passar é: se você pretende lançar algum produto, serviço, método, ferramentas, etc. no mercado, se preocupe com a facilidade de uso de Conservadores (em demais retardatários).
Espero que tenha gostado do artigo “Curva de adoção da inovação: os desafios de criar um novo produto”! Aproveite para comentar abaixo qual o maior desafio que você enfrentou na hora de criar um novo produto.